Peter Lee

A disciplina de História está sempre numa posição vulnerável. Quando se pretende reduzir o tempo de currículo, ela é sempre uma das candidatas a cortes ou a integração noutras disciplinas. No entanto, e paradoxalmente, sempre que o currículo está em discussão, é invariavelmente a História que é o foco de controvérsia. A ignorância dos factos ou histórias que simbolizam o passado politicamente correto torna-se nada menos do que uma questão nacional.

Na realidade, a História é mais importante do que o que quer que estas coisas sugiram. A História aqui significa mais uma maneira de ver o mundo, uma maneira (relativamente) racional de lidar com o passado. Não significa o próprio passado em si mesmo, de alguma forma não mediatizado, ou uma qualquer disciplina escolar. Neste sentido, como Dennis Shemilt apontou, a História é mais importante do que uma qualquer história particular sobre o passado.

A disciplina de História não é, portanto, o mero estudo de histórias particulares. Também nem é, sequer, a oferta aos alunos de múltiplas histórias para serem criticadas. Ela é, naturalmente, a aprendizagem acerca do passado produzido pela História, mas é também a aprendizagem sobre a natureza e o estatuto do conhecimento histórico. Para além de aprenderem factos e histórias, os alunos devem estar equipados com uma “caixa de ferramentas” intelectual para lidarem com o passado de uma maneira histórica. A História, na escola, não deve transformar os alunos em mini-historiadores profissionais, e não deve tentar, mas pode começar a ajudá-los a perceber como as interpretações históricas são baseadas na evidência, que as explicações não são o mesmo que afirmações factuais singulares, e que está na natureza da História haver diversas versões do passado, embora nada disto signifique que a História é apenas uma questão de opinião.

Isto pode parecer um objetivo grandioso, até que nos lembremos que os estudantes têm de pôr hipóteses sobre o que é a História, quer nós os tentemos ajudar ou não, e que a compreensão não é uma questão de tudo ou nada.

Uma abordagem que reconhece a importância de ensinar História, não apenas versões do passado, tem o mérito adicional de tirar algum vigor aos argumentos sobre que conteúdos ensinar. Os estudantes não aprenderão apenas uma versão do passado, portanto as preocupações sobre qual delas será a melhor, ficam de certa forma esbatidas. Eles irão aprender porque é que algumas versões ou explicações são mais seguras do que outras.

Uma vez que seja reconhecido que os estudantes nas escolas devem ser ensinados sobre História bem como sobre o passado, professores e pesquisadores começam a pensar de uma nova forma. Se nós temos de desenvolver as ideias dos estudantes, precisamos de saber que tipos de ideias são antes de começarmos. Os resultados da pesquisa em todo o mundo começam a sugerir que a História é contraintuitiva, isto é, que algumas hipóteses dos alunos sobre a História, baseadas no senso comum, podem estar em conflito com aquelas que constituem os pressupostos da pesquisa histórica. Concretamente, se queremos dar aos alunos ideias mais poderosas, e também algumas competências sobre critérios históricos, precisamos de saber as compreensões tácitas com as quais eles estão a trabalhar e orientá-las.

A tarefa dos professores de História é ajudar os alunos a compreender que a História não é dada quer, misteriosamente, por manuais ou testemunhas neutrais, mas que é provisória. Mas a tarefa não pode parar aí: os estudantes precisam de uma ferramenta intelectual que lhes permita distinguir entre diferentes tipos de interpretações históricas. Os estudantes podem então reconhecer que explicações e narrativas requerem justificações mais complexas do que afirmações factuais isoladas. Eles podem então começar a ver que muitas das bases factuais da História são, na realidade, muito seguras, e que, se as explicações e as narrativas são provisórias e contestáveis, isto não as reduz automaticamente ao estatuto de serem apenas questões de opinião pessoal.

À medida que começamos a compreender as ideias dos estudantes, aprender História pode escapar da discussão interminável sobre que História deve ser ensinada, mas têm de sabê-lo através da História, e isso significa entender que não pode nunca haver apenas uma história e que algumas histórias são mais válidas do que outras. Para perceber isto, eles precisam de entender alguma coisa sobre a natureza e o estatuto do conhecimento histórico.

Peter Lee

Este excerto encontra-se no Prefácio da obra
O pensamento Histórico dos Jovens
da autoria de Isabel Barca.

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