José Tengarrinha
Vejamos a questão, brevemente, em duas vertentes:
1. A importância, em si própria, do ensino da História, nomeadamente nos Ensinos Básico e Secundário, sendo certo que a formação dos alunos nessas idades exige uma forte componente humanística, que é reconhecidamente um dos principais atributos da disciplina.
A verdade, porém, é que, em vez de ser valorizado, esse ensino tem vindo a apagar-se e corre ainda mais o risco de minguar. Ora esse rumo está até em contradição com recomendações de organizações internacionais. Recorde-se, por exemplo, as resoluções da XIX Conferência da Educação Europeia, que destacadamente sublinharam a necessidade de promover o ensino da História, para o que se decidiu a constituição de grupos de trabalho e a realização de “Encontros Internacionais”. Mas atente-se que a importância do ensino da História – num mundo dominado pela visão utilitarista, e não raro finalizadora, pela premência da eficácia imediata – não deverá confinar-se a procurar projetar o passado sobre o presente ou estabelecer entre eles uma relação simples, como sendo o passado histórico um instrumento explicativo do presente. Devem salvaguardar-se as distâncias, relativizar as incidências e procurar dar a conhecer os mecanismos da mudança, na multiplicidade dos processos evolutivos das sociedades e das civilizações.
2. A questão das Histórias nacionais versus Histórias gerais.
Sabe-se como, perante a ameaça das estreitas dogmáticas conduzindo a exacerbações nacionalistas, a UNESCO promoveu uma campanha para rever o conteúdo dos livros de ensino da História. Avançando mais, o Conselho da Europa quis assentar as bases de um “conceito europeu”. Com esse fim realizaram-se diversas conversações internacionais em que se procurou encontrar prioritariamente as bases desse conceito e expressá-lo depois nos Programas e manuais escolares. Era a tendência para uma visão uniforme da História Europeia, alicerçada em determinados cânones convencionais e numa perspetiva supranacionalista. Parecia haver, mesmo, a intenção de a tudo sobrepor uma espécie de “nacionalismo europeu”, que ninguém sabia exatamente o que era.
Também esta tendência se refletiu entre nós, na subalternização da História de Portugal perante a “Geral” ou a “Europeia”. Ao limite, dificilmente nos esqueceremos de uma ministra da Educação que, perante as câmaras da televisão, afirmou secamente que o ensino da História portuguesa era desnecessário.
A orientação deve ser exatamente a inversa. Partir da plurinacionalidade, conceber a “identidade europeia” com base na rica diversidade da sua História.Uma das principais lições desta, julgo ser precisamente a experiência de, através de caminhos nem sempre fáceis e muitas vezes dolorosos, ter sido possível encontrar algum equilíbrio entre tão diversas formações e percursos das sociedades, das nacionalidades, das crenças. Partir das Histórias nacionais, pois, e seguir depois para o estudo comparado das sociedades como dimensão fundamental para entender a marcha das sociedades não como fenómenos “únicos”, “exemplares” ou “modelos”, mas numa apreciação relativizada, como percursos parcelares do fenómeno conjunto da História da Humanidade.
Em tal direção, será a História uma das disciplinas mais eficazes para contrariar as crescentes vagas de xenofobia, racismo e intolerância que estão entre os sinais mais preocupantes do mundo atual.
José Tengarrinha